Faz de conta (16/06)
Na saúde, os governos acham que gastam muito e os profissionais acham que ganham menos do que deveriam -e trabalham além do que seria justo. E os usuários do serviço pedem sempre além. E o distinto público pagador de impostos não quer nem ouvir falar em pagar mais
A Câmara dos Deputados prepara concluir a votação da emenda constitucional 29, aparentemente com acordo para não recriar a Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF) renomeada. A ideia é boa. Garantir recursos suficientes para a saúde, essa primeira preocupação dos brasileiros em todas as pesquisas.
Há entretanto uma lacuna permanente no debate. Quantos seriam os “recursos suficientes”? Ninguém sabe, ou pelo menos ninguém diz. A única referência sempre apresentada é comparar o que se gasta aqui e em outros países. E os números relativos são assustadores.
Nos Estados Unidos, que também enfrentam uma disputa política interminável nessa pauta, investe-se dez vezes mais, por habitante.
Duas conclusões. A primeira: a saúde precisa de mais verbas. A segunda: nenhuma proposta colocada na mesa resolveria, nem de longe, o problema do financiamento. É só olhar os números de receita adicional projetada pelas alternativas.
Em resumo, se é verdade que deputados, senadores e membros do Executivo participantes da empreitada ganham pontos políticos mostrando preocupação com uma agenda tão sensível, é verdade também que até agora ninguém apareceu com a mágica de resolver mesmo o problema, na real.
Pois alguém precisará pagar a conta.
Também porque se a saúde tem problemas de financiamento, a gestão não é uma brastemp.
O ministro anterior, José Gomes Temporão, desperdiçou capital político na batalha, afinal inútil, para flexibilizar as regras do setor. Pretendeu criar as fundações estatais de direito privado, que reuniriam o “melhor” de dois mundos: garantia de verbas públicas e liberdade típica do setor privado para comprar e contratar. E demitir.
A coisa não andou, inclusive pela saudável desconfiança de que abriria uma larga autopista para todo tipo de irregularidade.
Enfrentou naturalmente a resistência feroz das corporações mais orgânicas da área. A proposta recebia a esperada simpatia dos detentores de cargos executivos, o pessoal cobrado pela população, mas não atravessou a barreira político-corporativa.
Na saúde, os governos acham que gastam muito, enquanto os profissionais acham que ganham menos do que deveriam e trabalham além do que seria justo. E os usuários do serviço pedem sempre mais. E o distinto público pagador de impostos não quer nem ouvir falar em pagar mais.
Há algum preconceito diante do SUS (Sistema Único de Saúde), pois as pesquisas mostram que a aprovação dele no público que o utiliza é sempre maior do que na população em geral.
Mas o SUS é uma obra inconclusa. E ninguém quer assumir a responsabilidade de dizer quanto custa concluí-la. E fica esse jogo de faz de conta.
Eu mando
Os problemas políticos do governo são conhecidos. Menos divulgadas são as circunstâncias operacionais. Uma delas é a obsessão de sua excelência com os mínimos detalhes.
Se é verdade que o diabo mora nos detalhes, então talvez seja o caso de creditar ao tinhoso certa culpa nas confusões recentes que contaminam a atmosfera política. A presidente cuida de tantas minúcias do dia a dia que parece não lhe sobrar tempo para antecipar as encrencas maiores.
É um estilo gerencial como qualquer outro, Há quem goste de delegar e há os centralizadores por vocação. Dilma Rousseff tem cadeira cativa na segunda categoria. Se é bom ou ruim, os resultados mostrarão. De todo modo, governo é bicho grande demais para ser controlado perenemente na base do quem manda sou eu.
TCU
O governo quebra a cabeça para não ser derrotado daqui a alguns meses na votação da Câmara dos Deputados para preencher uma vaga a ser aberta no Tribunal de Contas da União.
Coluna (Nas entrelinhas) publicada nesta quinta (22) no Correio Braziliense.
Follow @AlonFe
youtube.com/blogdoalon
Para inserir um comentário, clique sobre a palavra "comentários", abaixo
Para obter um link para este texto, clique com o botão direito do mouse no horário de postagem, abaixo
A Câmara dos Deputados prepara concluir a votação da emenda constitucional 29, aparentemente com acordo para não recriar a Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF) renomeada. A ideia é boa. Garantir recursos suficientes para a saúde, essa primeira preocupação dos brasileiros em todas as pesquisas.
Há entretanto uma lacuna permanente no debate. Quantos seriam os “recursos suficientes”? Ninguém sabe, ou pelo menos ninguém diz. A única referência sempre apresentada é comparar o que se gasta aqui e em outros países. E os números relativos são assustadores.
Nos Estados Unidos, que também enfrentam uma disputa política interminável nessa pauta, investe-se dez vezes mais, por habitante.
Duas conclusões. A primeira: a saúde precisa de mais verbas. A segunda: nenhuma proposta colocada na mesa resolveria, nem de longe, o problema do financiamento. É só olhar os números de receita adicional projetada pelas alternativas.
Em resumo, se é verdade que deputados, senadores e membros do Executivo participantes da empreitada ganham pontos políticos mostrando preocupação com uma agenda tão sensível, é verdade também que até agora ninguém apareceu com a mágica de resolver mesmo o problema, na real.
Pois alguém precisará pagar a conta.
Também porque se a saúde tem problemas de financiamento, a gestão não é uma brastemp.
O ministro anterior, José Gomes Temporão, desperdiçou capital político na batalha, afinal inútil, para flexibilizar as regras do setor. Pretendeu criar as fundações estatais de direito privado, que reuniriam o “melhor” de dois mundos: garantia de verbas públicas e liberdade típica do setor privado para comprar e contratar. E demitir.
A coisa não andou, inclusive pela saudável desconfiança de que abriria uma larga autopista para todo tipo de irregularidade.
Enfrentou naturalmente a resistência feroz das corporações mais orgânicas da área. A proposta recebia a esperada simpatia dos detentores de cargos executivos, o pessoal cobrado pela população, mas não atravessou a barreira político-corporativa.
Na saúde, os governos acham que gastam muito, enquanto os profissionais acham que ganham menos do que deveriam e trabalham além do que seria justo. E os usuários do serviço pedem sempre mais. E o distinto público pagador de impostos não quer nem ouvir falar em pagar mais.
Há algum preconceito diante do SUS (Sistema Único de Saúde), pois as pesquisas mostram que a aprovação dele no público que o utiliza é sempre maior do que na população em geral.
Mas o SUS é uma obra inconclusa. E ninguém quer assumir a responsabilidade de dizer quanto custa concluí-la. E fica esse jogo de faz de conta.
Eu mando
Os problemas políticos do governo são conhecidos. Menos divulgadas são as circunstâncias operacionais. Uma delas é a obsessão de sua excelência com os mínimos detalhes.
Se é verdade que o diabo mora nos detalhes, então talvez seja o caso de creditar ao tinhoso certa culpa nas confusões recentes que contaminam a atmosfera política. A presidente cuida de tantas minúcias do dia a dia que parece não lhe sobrar tempo para antecipar as encrencas maiores.
É um estilo gerencial como qualquer outro, Há quem goste de delegar e há os centralizadores por vocação. Dilma Rousseff tem cadeira cativa na segunda categoria. Se é bom ou ruim, os resultados mostrarão. De todo modo, governo é bicho grande demais para ser controlado perenemente na base do quem manda sou eu.
TCU
O governo quebra a cabeça para não ser derrotado daqui a alguns meses na votação da Câmara dos Deputados para preencher uma vaga a ser aberta no Tribunal de Contas da União.
Coluna (Nas entrelinhas) publicada nesta quinta (22) no Correio Braziliense.
Follow @AlonFe
youtube.com/blogdoalon
Para inserir um comentário, clique sobre a palavra "comentários", abaixo
Para obter um link para este texto, clique com o botão direito do mouse no horário de postagem, abaixo
4 Comentários:
Alon, vale a pena dar uma olhada em matérias q a Economist publicou recentemte s/ o tema, muito em função dos problemas q o Obama enfrenta e da reforma do NHS. Se reconhece um fato: + gasto ñ significa + saúde. Aqui, apenas um exemplo de um desses txts:
Um pouco +:
Num país onde 80 por cento da população é sustentada por 20 por cento (a verdadeira classe média), nunca o financiamento da saúde será possível. A classe média faz um favor aos pobres ao financiá-los (em tudo!).
E, pior, com a demagógica regulamentação dos planos de saúde, brevemente teremos também a falência da saúde privada. Será o fim.
Há algum preconceito diante do SUS (Sistema Único de Saúde), pois as pesquisas mostram que a aprovação dele no público que o utiliza é sempre maior do que na população em geral.
ches- Alon , isso é tautologia. Porque quem não usa paga e não aceita, e quem usa não tem outra alternativa. E não paga.
Postar um comentário
<< Home