Sem espaço para errar (15/08)
Quando você precisa se explicar a toda hora é porque alguma coisa não vai bem. Essa é uma regra geral, sem margem de erro ou grau de incerteza
Na véspera dos programas e inserções eleitorais de rádio e televisão, não apenas os candidatos estão alinhados para a largada, mas também os institutos de pesquisa. Após meses de alguma dissonância, os quatro (Datafolha, Ibope, Sensus, Vox Populi) dizem mais ou menos a mesma coisa: Dilma Rousseff (PT) abre esta etapa na frente de José Serra (PSDB). Por poucos pontos, ainda na casa de um dígito.
Enquanto afirmavam coisas diferentes, os institutos andaram estranhando-se nos números e nas interpretações, com a natural repercussão entre as torcidas. Assim como no jornalismo, o “pesquisismo” também tem sido cenário para o “você está dizendo isso só porque apoia fulano”. É a conversa da arquibancada. Na versão benigna.
Já no campo de jogo a peleja tem outras regras: as caneladas e carrinhos vêm na forma de polêmicas entre o “ponto de fluxo” e a “consulta domiciliar”, entre fazer a indagação sobre o voto antes ou depois de perguntar o que acha do governo, entre dizer ou não que o candidato “x” é apoiado pelo político “y”. E, se não é suficiente, tem sempre a margem de erro para dar uma mãozinha.
Mais ainda. Tem uma coisa chamada “incerteza”. Com as mesmas letras miudinhas dos contratos duvidosos, os institutos avisam sempre haver uma chance (geralmente 5%) de a pesquisa estar completamente errada. De o resultado colhido na amostra ser diferente (para além da margem de erro) do que seria se todo o universo fosse auscultado.
Nas pesquisas, como nos consultórios médicos, o doutor sempre tem razão, até quando não tem. Pois ciência mesmo é dar a si próprio uma probabilidade generosa de estar errado. O tratamento não funcionou? Lamento, mas você está naqueles poucos casos em que não funciona. Tudo bem, doutor, mas o senhor me devolve então o dinheiro das consultas? E dos remédios?
Um consenso é que institutos de pesquisa vivem da credibilidade. Será? Assim como políticos vivem de ganhar eleição, pesquiseiros precisam acertar. No desfecho, claro, mas também nas parciais. Com um detalhe: é fácil verificar se a pesquisa de véspera de eleição acertou, basta compará-la com o resultado. Já nas parciais é mais complicado, pois só dá para comparar mesmo umas pesquisas com as outras.
Agora, por enquanto Sensus e Vox Populi estão levando vantagem sobre o Datafolha, com o Ibope mais ou menos no zero a zero. Já duas vezes o Datafolha chegou a resultados parecidos com os dos concorrentes, mas depois. Hoje as pessoas creem que Dilma ultrapassou Serra, e quem apontou nisso primeiro anda numa boa. Já os outros têm que se explicar.
E quando você precisa se explicar a toda hora é porque alguma coisa não vai bem. Essa é uma regra geral, sem margem de erro ou grau de incerteza.
Isso garante que uns estejam “certos” e os outros, “errados”? Claro que não. No limite podem estar todos errados.
E daí? O drama para os institutos de pesquisa é que a disputa entre eles na maior parte do tempo se passa numa esfera intangível, a das percepções. Daí o valor da tal “credibilidade”. Se eu tenho credibilidade, tenho e ponto final. Mas credibilidade nenhuma resiste intocada ao erro. Menos ainda ao erro sistemático e à necessidade sistemática de se explicar.
E mesmo quem não larga na corrida com muita credibilidade pode acumular capital político, se acertar mais do que os outros, se der sistematicamente a impressão de que vai na frente e os adversários vão atrás. Aliás, quem precisa recorrer muito à própria credibilidade está a meio caminho dar um tchauzinho a ela.
Vai começar
O desafio para para os profissionais de Marina Siva é impedir que seja tragada pelo escasso tempo de tela e pela polarização há muito anunciada. Já no caso de José Serra, a tarefa, não trivial, é explicar por que mudar se as coisas vão bem. A missão de Dilma Rousseff é mais simples, basta impedir que Serra consiga dar essa explicação.
Dilma chega na frente na largada, o que é bom para ela. Estar na frente é sempre melhor. Serra chega precisando segurar um punhado de votos para levar a eleição ao segundo turno. E virar um punhado deles para ganhar.
Numa eleição em que esse punhado é de cinco milhões num universo de 135 milhões, dizer que ela já acabou parece algo precipitado.
Mas é óbvio que o grande desafio está no campo de Serra e não no de Dilma.
Coluna (Nas entrelinhas) publicada neste domingo (15) no Correio Braziliense.
twitter.com/AlonFe
youtube.com/blogdoalon
Para inserir um comentário, clique sobre a palavra "comentários", abaixo
Na véspera dos programas e inserções eleitorais de rádio e televisão, não apenas os candidatos estão alinhados para a largada, mas também os institutos de pesquisa. Após meses de alguma dissonância, os quatro (Datafolha, Ibope, Sensus, Vox Populi) dizem mais ou menos a mesma coisa: Dilma Rousseff (PT) abre esta etapa na frente de José Serra (PSDB). Por poucos pontos, ainda na casa de um dígito.
Enquanto afirmavam coisas diferentes, os institutos andaram estranhando-se nos números e nas interpretações, com a natural repercussão entre as torcidas. Assim como no jornalismo, o “pesquisismo” também tem sido cenário para o “você está dizendo isso só porque apoia fulano”. É a conversa da arquibancada. Na versão benigna.
Já no campo de jogo a peleja tem outras regras: as caneladas e carrinhos vêm na forma de polêmicas entre o “ponto de fluxo” e a “consulta domiciliar”, entre fazer a indagação sobre o voto antes ou depois de perguntar o que acha do governo, entre dizer ou não que o candidato “x” é apoiado pelo político “y”. E, se não é suficiente, tem sempre a margem de erro para dar uma mãozinha.
Mais ainda. Tem uma coisa chamada “incerteza”. Com as mesmas letras miudinhas dos contratos duvidosos, os institutos avisam sempre haver uma chance (geralmente 5%) de a pesquisa estar completamente errada. De o resultado colhido na amostra ser diferente (para além da margem de erro) do que seria se todo o universo fosse auscultado.
Nas pesquisas, como nos consultórios médicos, o doutor sempre tem razão, até quando não tem. Pois ciência mesmo é dar a si próprio uma probabilidade generosa de estar errado. O tratamento não funcionou? Lamento, mas você está naqueles poucos casos em que não funciona. Tudo bem, doutor, mas o senhor me devolve então o dinheiro das consultas? E dos remédios?
Um consenso é que institutos de pesquisa vivem da credibilidade. Será? Assim como políticos vivem de ganhar eleição, pesquiseiros precisam acertar. No desfecho, claro, mas também nas parciais. Com um detalhe: é fácil verificar se a pesquisa de véspera de eleição acertou, basta compará-la com o resultado. Já nas parciais é mais complicado, pois só dá para comparar mesmo umas pesquisas com as outras.
Agora, por enquanto Sensus e Vox Populi estão levando vantagem sobre o Datafolha, com o Ibope mais ou menos no zero a zero. Já duas vezes o Datafolha chegou a resultados parecidos com os dos concorrentes, mas depois. Hoje as pessoas creem que Dilma ultrapassou Serra, e quem apontou nisso primeiro anda numa boa. Já os outros têm que se explicar.
E quando você precisa se explicar a toda hora é porque alguma coisa não vai bem. Essa é uma regra geral, sem margem de erro ou grau de incerteza.
Isso garante que uns estejam “certos” e os outros, “errados”? Claro que não. No limite podem estar todos errados.
E daí? O drama para os institutos de pesquisa é que a disputa entre eles na maior parte do tempo se passa numa esfera intangível, a das percepções. Daí o valor da tal “credibilidade”. Se eu tenho credibilidade, tenho e ponto final. Mas credibilidade nenhuma resiste intocada ao erro. Menos ainda ao erro sistemático e à necessidade sistemática de se explicar.
E mesmo quem não larga na corrida com muita credibilidade pode acumular capital político, se acertar mais do que os outros, se der sistematicamente a impressão de que vai na frente e os adversários vão atrás. Aliás, quem precisa recorrer muito à própria credibilidade está a meio caminho dar um tchauzinho a ela.
Vai começar
O desafio para para os profissionais de Marina Siva é impedir que seja tragada pelo escasso tempo de tela e pela polarização há muito anunciada. Já no caso de José Serra, a tarefa, não trivial, é explicar por que mudar se as coisas vão bem. A missão de Dilma Rousseff é mais simples, basta impedir que Serra consiga dar essa explicação.
Dilma chega na frente na largada, o que é bom para ela. Estar na frente é sempre melhor. Serra chega precisando segurar um punhado de votos para levar a eleição ao segundo turno. E virar um punhado deles para ganhar.
Numa eleição em que esse punhado é de cinco milhões num universo de 135 milhões, dizer que ela já acabou parece algo precipitado.
Mas é óbvio que o grande desafio está no campo de Serra e não no de Dilma.
Coluna (Nas entrelinhas) publicada neste domingo (15) no Correio Braziliense.
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4 Comentários:
Claro que não devolvo o valor da consulta, médico não vende cura, vende tratamento, que pode ou não dar resultado. Médico não tem obrigação de curar, isso é coisa de curandeiro. Médico tem obrigação de fazer tudo ao seu alcance, dentro do conhecimento médico mais atualizado, para tratar o paciente.
Se você acha que é moleza, entre na faculdade e...benvindo COLEGA!
A campanha eleitoral chegou ao esperado ponto crítico. Ainda está longe das eleições estarem definidas, pois, sempre há aspectos que não são captados por pesquisas qualititivas ou não. E nem pelos tracking. Contudo, os resultados até agora, só garantem que serão renhidas até 03 de outubro. Uns apostam na sensação de que o povo está sentindo-se muito bem com o que está ocorrendo na economia como o fator determinante. Outros apostam que tal sensação, se existir, não seja capaz de levar o eleitor a votar levando isso em conta. Afinal, governos têm de legar tais situações, por obrigação. Se o eleitor sente-se bem, não necessariamente ele deve premiar quem possa ser identificado como o propiciador disso. Isso se o identificar como tal.
Swamoro Songhay
Pois é, Alon. Aqui em Minas há muita expectativa com a próxima pesquisa Datafolha, já que o instituto tem se acertado com os números da Vox Populi com pelo menos duas semanas de atraso. O Datafolha está na contramão dos outros institutos de pesquisa por aqui: Na semana passada, a Vox deu 36 a 26, uma diferença de 10 pontos entre Hélio Costa e Anastasia. Isso depois que o Ibope registrou 34 a 21, no fim de julho. Ou seja, tudo indica que há uma tendência de crescimento da candidatura Anastasia. Vamos aguardar também o Ibope, que deve divulgar nova enquete por esses dias.
Caro Alon,
muito legal o texto. Aqui no RN os institutos estão publicando pesquisas com até 20% de diferença!!! Já faz tempo que gastaram a credibilidade por aqui.
abs.
daniel - natal/rn
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