Os limites do sociologismo (19/10)
O discurso de Lula sobre a segurança esgota-se em si, vira fumaça quando encontra a realidade. O país precisa de escolas e também de prisões
A violência explodiu no Rio de Janeiro e deu as caras no noticiário. Acontece de tempos em tempos. Daqui a pouco ela submerge de novo. As horríveis consequências do câncer da droga e do narcotráfico só são notícia em situações muito particulares: quando produzem imagens fortes (como no sábado) ou quando a tragédia vaza dos bolsões sociais em que deveria ficar confinada. Quando isso acontece, o mercado consumidor e a turma do lado de fora do muro vestem-se de branco e pedem "paz".
Mas, e as Olimpíadas de 2016? De duas, uma. Ou dá-se um jeito definitivo até lá, o que é improvável, ou haverá um armistício. Não é por ser bandido que o traficante é burro. E governantes costumam ser pragmáticos.
O recrudescer da insegurança no Rio chama o debate. Além das estatísticas, que já não são boas, a vida tem revelado outro fato: o tráfico de drogas e a violência que ele produz deixaram de ser um problema só das grandes concentrações urbanas, espalharam-se pelo país. E seguem a rota do dinheiro.
Quanto mais dinheiro, mais crime. Óbvio. Não há comparação, por exemplo, entre as estatísticas de criminalidade na periferia de São Paulo, ou do Rio, e os números do sertão nordestino.
Mas a pobreza não é muito maior no sertão do Nordeste do que na região metropolitana do Rio, ou de São Paulo? E a taxa de criminalidade não deveria ser proporcional ao grau de pobreza, à escassez das oportunidades para ganhar a vida?
Tem algo que não fecha nesse diagnóstico.
Alguns anos atrás, com o governo Luiz Inácio Lula da Silva já de vento em popa, um estudo apoiado pelo Ministério da Saúde procurou desenhar o mapa da violência no Brasil. A conclusão foi interessante. As regiões mais pobres (semiárido nordestino, Vale do Jequitinhonha) são bem menos violentas do que as áreas metropolitanas, do que a fronteira agrícola do Norte e do Centro-Oeste e do que as fronteiras com o Paraguai e a Bolívia.
Querem mais? O governo Lula gaba-se de ter feito a maior inclusão social da História do Brasil. Segundo os governistas, nunca antes neste país tantos pobres passaram para a classe média e nunca tantos jovens pobres receberam oportunidades de estudo e ascensão social.
Dado que a violência e a insegurança também cresceram, estamos diante de um buraco na teoria. De duas uma: ou o governo Lula não é essa brastemp no campo social, ou então não dá para relacionar mecanicamente mais prosperidade com menos criminalidade.
Esta gestão melhorou a situação dos pobres, até os adversários reconhecem. O furo na tese está na segunda opção. Só melhorar os indicadores sociais não ataca os problemas da segurança.
É bonito o presidente da República dizer que prefere construir escolas a erguer presídios. Pega bem entre os intelectuais e coloca os críticos na defensiva. Mas é um discurso que, como outros, esgota-se em si, vira fumaça quando entra em contato com a realidade. O país precisa de escolas e precisa também de prisões.
Assim como precisa de uma Justiça que consiga traçar com clareza a linha demarcatória entre honestos e criminosos. Assim como precisa de leis que sirvam para punir proporcionalmente os crimes, de acordo com a gravidade.
Não pode querer paz verdadeira um país que deixa solto o jornalista famoso e influente que, em ato de fria vingança, mata com um tiro pelas costas a ex-namorada. E apesar disso continua a viver a vida aqui fora como se nada tivesse feito de errado.
O país precisa de um governo que seja duro contra o crime e os criminosos, sem "coitadismo" e sem sociologismo barato. Duro com a mesma intensidade que Lula impulsiona iniciativas para melhorar a vida dos pobres. O ideal seria juntar as duas características.
Dúvida nuclear
A Venezuela associa-se ao Irã para produzir energia nuclear. Caracas diz que é para fins pacíficos. Há quem desconfie. Um detalhe porém é intrigante além da conta. Por que o Brasil, tão cioso de sua liderança regional, não ocupa esse espaço, por que não se oferece para substituir o Irã na empreitada?
Qual é o interesse nacional atendido pela aceitação, nas nossas fronteiras, de uma potência nuclear associada a um inimigo dos Estados Unidos? O Itamaraty poderia fazer a gentileza de explicar?
Coluna (Nas entrelinhas) publicada hoje no Correio Braziliense.
Leituras compartilhadas
twitter.com/AlonFeuerwerker
youtube.com/blogdoalon
Assine este blog no Bloglines
Clique aqui para mandar um email ao editor do blog
Para inserir um comentário, clique sobre a palavra "comentários", abaixo
A violência explodiu no Rio de Janeiro e deu as caras no noticiário. Acontece de tempos em tempos. Daqui a pouco ela submerge de novo. As horríveis consequências do câncer da droga e do narcotráfico só são notícia em situações muito particulares: quando produzem imagens fortes (como no sábado) ou quando a tragédia vaza dos bolsões sociais em que deveria ficar confinada. Quando isso acontece, o mercado consumidor e a turma do lado de fora do muro vestem-se de branco e pedem "paz".
Mas, e as Olimpíadas de 2016? De duas, uma. Ou dá-se um jeito definitivo até lá, o que é improvável, ou haverá um armistício. Não é por ser bandido que o traficante é burro. E governantes costumam ser pragmáticos.
O recrudescer da insegurança no Rio chama o debate. Além das estatísticas, que já não são boas, a vida tem revelado outro fato: o tráfico de drogas e a violência que ele produz deixaram de ser um problema só das grandes concentrações urbanas, espalharam-se pelo país. E seguem a rota do dinheiro.
Quanto mais dinheiro, mais crime. Óbvio. Não há comparação, por exemplo, entre as estatísticas de criminalidade na periferia de São Paulo, ou do Rio, e os números do sertão nordestino.
Mas a pobreza não é muito maior no sertão do Nordeste do que na região metropolitana do Rio, ou de São Paulo? E a taxa de criminalidade não deveria ser proporcional ao grau de pobreza, à escassez das oportunidades para ganhar a vida?
Tem algo que não fecha nesse diagnóstico.
Alguns anos atrás, com o governo Luiz Inácio Lula da Silva já de vento em popa, um estudo apoiado pelo Ministério da Saúde procurou desenhar o mapa da violência no Brasil. A conclusão foi interessante. As regiões mais pobres (semiárido nordestino, Vale do Jequitinhonha) são bem menos violentas do que as áreas metropolitanas, do que a fronteira agrícola do Norte e do Centro-Oeste e do que as fronteiras com o Paraguai e a Bolívia.
Querem mais? O governo Lula gaba-se de ter feito a maior inclusão social da História do Brasil. Segundo os governistas, nunca antes neste país tantos pobres passaram para a classe média e nunca tantos jovens pobres receberam oportunidades de estudo e ascensão social.
Dado que a violência e a insegurança também cresceram, estamos diante de um buraco na teoria. De duas uma: ou o governo Lula não é essa brastemp no campo social, ou então não dá para relacionar mecanicamente mais prosperidade com menos criminalidade.
Esta gestão melhorou a situação dos pobres, até os adversários reconhecem. O furo na tese está na segunda opção. Só melhorar os indicadores sociais não ataca os problemas da segurança.
É bonito o presidente da República dizer que prefere construir escolas a erguer presídios. Pega bem entre os intelectuais e coloca os críticos na defensiva. Mas é um discurso que, como outros, esgota-se em si, vira fumaça quando entra em contato com a realidade. O país precisa de escolas e precisa também de prisões.
Assim como precisa de uma Justiça que consiga traçar com clareza a linha demarcatória entre honestos e criminosos. Assim como precisa de leis que sirvam para punir proporcionalmente os crimes, de acordo com a gravidade.
Não pode querer paz verdadeira um país que deixa solto o jornalista famoso e influente que, em ato de fria vingança, mata com um tiro pelas costas a ex-namorada. E apesar disso continua a viver a vida aqui fora como se nada tivesse feito de errado.
O país precisa de um governo que seja duro contra o crime e os criminosos, sem "coitadismo" e sem sociologismo barato. Duro com a mesma intensidade que Lula impulsiona iniciativas para melhorar a vida dos pobres. O ideal seria juntar as duas características.
Dúvida nuclear
A Venezuela associa-se ao Irã para produzir energia nuclear. Caracas diz que é para fins pacíficos. Há quem desconfie. Um detalhe porém é intrigante além da conta. Por que o Brasil, tão cioso de sua liderança regional, não ocupa esse espaço, por que não se oferece para substituir o Irã na empreitada?
Qual é o interesse nacional atendido pela aceitação, nas nossas fronteiras, de uma potência nuclear associada a um inimigo dos Estados Unidos? O Itamaraty poderia fazer a gentileza de explicar?
Coluna (Nas entrelinhas) publicada hoje no Correio Braziliense.
Leituras compartilhadas
twitter.com/AlonFeuerwerker
youtube.com/blogdoalon
Assine este blog no Bloglines
Clique aqui para mandar um email ao editor do blog
Para inserir um comentário, clique sobre a palavra "comentários", abaixo
6 Comentários:
É no mínimo bastate constrangedor, o fato de que os eventos no Rio de janeiro têm sido tornado viáveis, mediante "acordos comerciais e operacionais", não escritos, envolvendo o Poder Público (Estadual, Municipal e Federal) e o Tráfico de Entorpecentes.
No período dos eventos a Polícia finge que policia e o Tráfico finge que não trafica.
não tente achar lógicas e explicações no governo brasileiro. elas não existem!
Alon, MUITO OBRIGADO por dizer o que tantos de nós pensamos.
Qual governo se propõe a fazer isso? Se a esquerda democrática não se propuser a enfrentar esse problema de frente e com seriedade (e o da desproporção das penas, da progressão das penas com frações diminutas de cumprimento, assim como da concessão de liberdade provisória por mil recursos é de obrigação do Congresso Nacional e da agenda legislativa do Poder Executivo), em 2014, 2018, 2022...a solução pode vir de onde menos se espera. E a população vai aceitar, vai até pedir, dureza e autoritarismo.
Alon, falou, falou...E não escreveu a palavra Judiciário UMA ÚNICA VEZ...falou nada...logo tu é CONDECORADO...
Alon,
Você está me surpreendendo.
E logo eu, que raramente me surprendo.
Essa sua análise da pobreza como causa da violência foi precária, rasteira demais, e muito aquém do que espero e do que sei que você é capaz de produzir.
Comparar a pobreza do nosso interiorzão com a entranhada nas nossas metrópoles é um despropósito vulgar.
De quem um adolescente de algum daqueles aglomerados do Vale do Jequetinhonha vai roubar um toca fitas(CD); e roubando, para quem venderá o produto de sua indústria?
Sou de um tempo em que as opções para a delinquência eram muito restritas para os de debaixo.
Lembro de meu pai juntando num balaio os pintinhos que seriam levados à delegacia para comprovar junto ao Delegado o roubo de umas galinhas; mais tarde chegou em casa com os pintinhos e um bando de galinhas, entre elas a choca.
O ladrão passou uns dois ou três dias em cana e quando solto sumiu da cidade. Nem passou pela cabeça dele ficar por lá e fundar o PCLG, Primeiro Comando dos Ladrões de Galinha.
Numa metrópole de hoje como São Paulo ou Rio alguém se constrange em delinquir?
Mas a esperiência pessoal que viví na infância ainda sobrevive entre os habitantes desses recônditos que você tomou como exemplo.
Algo inimaginável nas associações que se constroem nas franjas periféricas, e no Rio nem tão periféricas assim, dos nossos grandes centros atuais.
Alon, a pobreza pode levar ao esgarçamento social, e este pode levar à delinquência.
Pobreza nunca teve ligação direta com o crime.
E, por favor, tire o Pimenta dessa discussão.
Fora as mazelas da nossa justiça, a miséria que aflige o ancião jornalista é a miséria intrínseca à nossa condição humana, independente de posição social ou econômica ou da rigorosidade da justiça.
E nada há que a justiça possa fazer e que possa ser tomado como verdadeira justiça.
Vamos separar as misérias evitáveis daquelas inexoráveis.
Mas me assustei mesmo foi com esta passagem:
"(...) uma Justiça que consiga traçar com clareza a linha demarcatória entre honestos e criminosos"
Rapaz, você está sendo guiado por alguma luz divina?
Abraços,
daSilvaEdison
Quando o presidente do Irã, Mahmoud Ahmadinejad, fizer sua visita ao
Brasil, peça para o presidente Lula perguntar a ele como são tratados os terroristas, traficantes e drogados naquele país. Poderiamos comprar a tecnologia deles. Afinal o que impede que tenhamos leis duríssimas contra esse tipo de crime? Será que nossos representantes no congresso têm medo de aprovar uma lei mais severa porque temem, eles próprios, a possibilidade de serem enquadrados por ela? Enquanto isso ficamos com a solução proposta pelo Cabral: “Vamos comprar um helicóptero blindado”. Isso é patético…
Postar um comentário
<< Home