A luta para entrar no barco (30/11)
It is difficult to get a man to understand something, when his salary depends upon his not understanding it.
É difícil levar alguém a entender algo quando seu salário depende de que não entenda. Eu registro aqui o "teorema de Upton Sinclair", como definiu Krugman em seu blog, apenas para dar idéia da alta temperatura. Você que me conhece sabe que eu prefiro o oposto, esfriar a polêmica e evitar que os argumentos cozinhem e se desnaturem no fogo das paixões. Foi o que escrevi em Este é um blog moderado. Habituem-se:
Um argumento que rejeito sistematicamente é o pecuniário. Algo mais ou menos na linha "fulano de tal só defende isso pois tem um emprego no -ou recebe dinheiro do- governo de sicrano". Há certos debates de que participo. De outros, não. Não entro em polêmicas que, a prevalecer a lógica, tendem a um beco sem saída. As aspas acima são um exemplo. Vamos trabalhar com a situação em que o personagem A acusa o personagem B de escrever textos (ou dar declarações) favoráveis ao governo de C porque leva algum tipo de vantagem monetária, direta ou indireta. Ora, se é razoável supor que B apoia C porque leva alguma vantagem, é também legítimo acolher a hipótese de que A só se opõe a C por não ter tido acesso aos benefícios recebidos por B. Pau que dá em Chico dá em Francisco.
Mas será possível discutir política assim, só no plano nas idéias? Tentemos. O conservadorismo econômico, em baixa, procura se levantar da lona antes que o juiz conte até dez. Uma vez de pé, a pancadaria só vai aumentar, precavenham-se. A agitação contra o empréstimo dos bancos públicos para a Petrobrás é um sintoma. Qual é a essência do debate econômico nesta crise? Se o Estado deve ou não se meter no mercado, estimulando a criação de empregos e garantindo uma certa renda para o trabalho. Quem acha que sim diz que em situações tendentes à depressão é preciso garantir emprego e renda para que o trabalhador/consumidor projete uma renda futura e tenha confiança para comprar. São situações em que a taxa de juros perde poder de tração, como aconteceu por exemplo na recessão japonesa dos anos 90, quando a economia parou de crescer mesmo depois de os juros ficarem negativos. Já a oposição a esse ponto de vista sustenta que o Estado proporcionar níveis de emprego e renda "artificiais" é prejudicial, pois reduz a produtividade do capital, já que incrementa custos, incremento que não será compensado pela criação do valor correspondente. Isso foi pinçado por Krugman do texto de Will. E o capital ficar assim, de breque de mão meio puxado, atrasaria a volta ao dinamismo econômico. Para detalhar mais o último ponto de vista: trata-se de reduzir o preço do trabalho e eliminar, por meio da consolidação, estoques menos produtivos de capital, para abrir caminho à recuperação. Onde está a razão no duelo intelectual? Dependendo do ângulo do observador, pode estar em qualquer um dos dois pólos. Ou em algum ponto intermediário. Pois não há uma "razão" única. O que há é a luta de classes, ainda que a expressão possa doer nos estômagos mais sensíveis. Cada um, cada lado, cada personagem peleja para que os recursos da sociedade, recolhidos pelo Estado, ajudem a atravessar a tempestade, a escapar do naufrágio. É uma disputa por vagas no bote salva-vidas. Até porque, recorde-se, não se ouviram dos radicais do mercado críticas na fase da crise, semanas atrás, em que se tratava de os Estados intervirem enlouquecidamente para salvar bancos. Agora, bem alojados no banquinho e enrolados no cobertor quentinho, dão pancadas com o remo nas mãos, nos braços e nas cabeças dos infelizes que se agarram ao barco para tentar sair da água.
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