Um personagem contraditório
Alon Feuerwerker
Correio Braziliense, 29 de setembro de 2005 - O novo presidente da Câmara dos Deputados, Aldo Rebelo (PCdoB-SP), é alagoano. Como seu grande ídolo na política, o marechal Floriano Peixoto. Quando a esquerda catarinense quis mudar o nome de Florianópolis, em protesto contra a história supostamente autoritária do segundo presidente brasileiro, Rebelo criticou duramente a iniciativa.
Rebelo é um personagem contraditório. Seus interlocutores devem estar preparados para longas explanações sobre o papel do Duque de Caxias na consolidação e manutenção da unidade nacional. Mas é um admirador e estudioso das rebeliões gaúchas que tentaram antecipar a instalação da República.
Os paradoxos se estendem ao terreno das relações com as Forças Armadas. Rebelo pertence ao partido que organizou a mais consistente experiência guerrilheira no Brasil, o Araguaia. Entretanto, suas relações com os militares são sólidas, pois sempre rejeitou o viés anti-militarista do pensamento de esquerda construído na resistência ao regimede 1964.
Rebelo iniciou-se na política como estudante de Direito da Universidade Federal de Alagoas. Certa vez, articulava uma chapa para a eleição direta do Diretório Central dos Estudantes. Recebeu informações de que ela seria cassada e a eleição, anulada com base no decreto-lei 477, o AI-5 universitário. Resolveu o problema aceitando a eleição indireta a indicando para a cabeça da chapa um estudante que contava com a simpatia da reitoria.
Em 1979, ajudou a reorganizar a União Nacional dos Estudantes (UNE). Foi seu primeiro secretário-geral. No ano seguinte, elegeu-se presidente. Em 1981, o PCdoB mandou que se radicasse em São Paulo, para fazer política. Foi candidato a deputado federal em 1982 e 1986, sem sucesso. Eleito vereador na capital em 1988, conseguiu um mandato na Câmara dos Deputados dois anos depois. Desde então, reelege-se sucessivamente.
Antes de ser líder do governo Lula em 2003, era mais lembrado por projetos com traço folclórico. Inspirado numa iniciativa francesa, propôs restringir o uso de palavras estrangeiras. Recentemente, propôs aprovar o dia do Saci Pererê. Sua passagem pelo governo Lula pode ser dividida em duas etapas.
Em 2003, foi o líder que aprovou as reformas e outras medidas que contribuíram para construir as bases da retomada do crescimento da economia. Em maio daquele ano, chocou seu partido ao defender da tribuna a elevação das taxas de juros como necessária para o controle da inflação. Menos por convicção, mais por acreditar que poderia dar certo, defendeu desde o início a política econômica do ministro Antônio Palocci.
Foi chamado para a Coordenação Política em janeiro de 2004. Com quinze dias no cargo, viu explodir no seu colo o caso Waldomiro. Dois meses depois, articulou para que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva ficasse neutro no debate sobre a emenda que permitiria a reeleição dos presidentes da Câmara e do Senado. Era um favor a seu amigo de longa data Renan Calheiros (PMDB-AL). Foi o início de uma sangrenta guerra com o PT, o então ministro José Dirceu (PT-SP), hoje deputado, e o então presidente da Câmara, João Paulo Cunha (PT-SP).
Foi considerado demitido várias vezes, até que, finamente, deixou o governo em julho deste ano. Voltou a ser um deputado comum. Até que a renúncia de Severino Cavalcanti abriu-lhe caminho para ser o segundo na linha de sucessão da presidência da República. Foi a ocasião para que Renan retribuísse o favor ao conterrâneo. O episódio revelou um fato que só seus amigos conhecem: Rebelo é um sujeito de muita, muita sorte. Isso é também uma fonte de temores. "Só pode ser coisa deDeus", diz sempre, antes de lembrar que "um dia ele pode decidir que já passou da conta comigo".
Correio Braziliense, 29 de setembro de 2005 - O novo presidente da Câmara dos Deputados, Aldo Rebelo (PCdoB-SP), é alagoano. Como seu grande ídolo na política, o marechal Floriano Peixoto. Quando a esquerda catarinense quis mudar o nome de Florianópolis, em protesto contra a história supostamente autoritária do segundo presidente brasileiro, Rebelo criticou duramente a iniciativa.
Rebelo é um personagem contraditório. Seus interlocutores devem estar preparados para longas explanações sobre o papel do Duque de Caxias na consolidação e manutenção da unidade nacional. Mas é um admirador e estudioso das rebeliões gaúchas que tentaram antecipar a instalação da República.
Os paradoxos se estendem ao terreno das relações com as Forças Armadas. Rebelo pertence ao partido que organizou a mais consistente experiência guerrilheira no Brasil, o Araguaia. Entretanto, suas relações com os militares são sólidas, pois sempre rejeitou o viés anti-militarista do pensamento de esquerda construído na resistência ao regimede 1964.
Rebelo iniciou-se na política como estudante de Direito da Universidade Federal de Alagoas. Certa vez, articulava uma chapa para a eleição direta do Diretório Central dos Estudantes. Recebeu informações de que ela seria cassada e a eleição, anulada com base no decreto-lei 477, o AI-5 universitário. Resolveu o problema aceitando a eleição indireta a indicando para a cabeça da chapa um estudante que contava com a simpatia da reitoria.
Em 1979, ajudou a reorganizar a União Nacional dos Estudantes (UNE). Foi seu primeiro secretário-geral. No ano seguinte, elegeu-se presidente. Em 1981, o PCdoB mandou que se radicasse em São Paulo, para fazer política. Foi candidato a deputado federal em 1982 e 1986, sem sucesso. Eleito vereador na capital em 1988, conseguiu um mandato na Câmara dos Deputados dois anos depois. Desde então, reelege-se sucessivamente.
Antes de ser líder do governo Lula em 2003, era mais lembrado por projetos com traço folclórico. Inspirado numa iniciativa francesa, propôs restringir o uso de palavras estrangeiras. Recentemente, propôs aprovar o dia do Saci Pererê. Sua passagem pelo governo Lula pode ser dividida em duas etapas.
Em 2003, foi o líder que aprovou as reformas e outras medidas que contribuíram para construir as bases da retomada do crescimento da economia. Em maio daquele ano, chocou seu partido ao defender da tribuna a elevação das taxas de juros como necessária para o controle da inflação. Menos por convicção, mais por acreditar que poderia dar certo, defendeu desde o início a política econômica do ministro Antônio Palocci.
Foi chamado para a Coordenação Política em janeiro de 2004. Com quinze dias no cargo, viu explodir no seu colo o caso Waldomiro. Dois meses depois, articulou para que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva ficasse neutro no debate sobre a emenda que permitiria a reeleição dos presidentes da Câmara e do Senado. Era um favor a seu amigo de longa data Renan Calheiros (PMDB-AL). Foi o início de uma sangrenta guerra com o PT, o então ministro José Dirceu (PT-SP), hoje deputado, e o então presidente da Câmara, João Paulo Cunha (PT-SP).
Foi considerado demitido várias vezes, até que, finamente, deixou o governo em julho deste ano. Voltou a ser um deputado comum. Até que a renúncia de Severino Cavalcanti abriu-lhe caminho para ser o segundo na linha de sucessão da presidência da República. Foi a ocasião para que Renan retribuísse o favor ao conterrâneo. O episódio revelou um fato que só seus amigos conhecem: Rebelo é um sujeito de muita, muita sorte. Isso é também uma fonte de temores. "Só pode ser coisa deDeus", diz sempre, antes de lembrar que "um dia ele pode decidir que já passou da conta comigo".
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